Cupons serão distribuídos para empresas indicarem alunos.
O novo sistema de distribuição de vouchers para treinamento e capacitação profissional, fruto de um acordo entre governo e indústria, está praticamente pronto. A expectativa é contemplar pelo menos 1,3 milhão de trabalhadores nos quase três anos de mandato que o presidente Jair Bolsonaro ainda tem pela frente – 300 mil em 2020, 510 mil em 2021 e outros 510 mil em 2022.
O programa de vouchers deriva da negociação feita pela equipe econômica com o Sistema S, que se comprometeria a deslocar cerca de R$ 4,5 bilhões anuais de orçamento dos serviços sociais autônomos para financiar uma nova Estratégia Nacional de Qualificação formulada pelo governo. Apenas a indústria entra em um primeiro momento do programa. Comércio e serviços ainda não tiveram acordo fechado.
Os cupons serão distribuídos pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), por meio de uma plataforma eletrônica, às empresas do setor e seguindo diretrizes do Ministério da Economia. Sem alarde, a plataforma começou a ser testada em escala reduzida para que haja a identificação de problemas antes do lançamento oficial do novo sistema, nos próximos meses.
As empresas – e não os trabalhadores – receberão os vouchers. Elas poderão indicar um empregado de seus quadros ou indivíduos de fora para os cursos do Senai. Nesse caso, podem ser pessoas que foram entrevistas pela área de recursos humanos de uma companhia, mas não tinham uma habilidade ou conhecimento específico e precisam de treinamento adicional. É apenas um exemplo e as empresas terão liberdade para fazer indicações, bem como quem fará qual curso.
“Um dos grandes problemas dos programas de qualificação profissional era o desalinhamento de oferta e demanda. A busca é por inverter essa lógica, colocando o foco no aumento da produtividade”, afirmou ao Valor o secretário especial de Produtividade, Emprego e Competitividade, Carlos Da Costa, responsável pelo programa.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, que já havia ameaçado “meter a faca” no Sistema S, tem uma visão crítica dos serviços sociais autônomos. Acha que eles atuam com pouco foco, são mal fiscalizados, gastam muito em sedes suntuosas e salários. As vagas oferecidas dentro do novo programa de cupons não são adicionais, ou seja, usam a capacidade já existente do Senai. Mas, na avaliação da equipe econômica, há um ganho de eficiência: os cursos passam a contemplar as necessidades reais das empresas e parte expressiva do orçamento para qualificação será agora orientada pelo governo.
“O aluno vai lá, faz o curso e a empresa consegue monitorar o desempenho dele – se ele concluiu e com que aproveitamento”, explicou Costa. “Quando os recursos eram muito fartos, talvez a ausência de foco não fosse um problema. Agora colocamos o setor produtivo no centro do processo.”
A cota de vouchers dependerá do tamanho de cada estabelecimento. Todas as indústrias vão receber pelo menos um cupom mediante cadastramento na plataforma. Micro e pequenas empresas (com até 99 funcionários) terão direito a vouchers correspondentes a 20% de sua força de trabalho. Empresas de médio porte (100 a 499 empregados) poderão solicitar volume equivalente a 10% do quadro pessoal. No caso das grandes (acima de 500 pessoas), serão 5%.
Não há dispêndio de recursos do Orçamento Geral da União com o novo programa, que usará dinheiro da contribuição compulsória das indústrias ao Sistema S. Por outro lado, ainda não há desoneração da folha de pagamento. As empresas pagam atualmente 3,1% sobre a folha para financiar os serviços sociais autônomos. O governo deve aproveitar a reforma tributária em tramitação no Congresso Nacional e reduzir esse percentual.
O total de recursos direcionados para o sistema de vouchers ainda não está sendo divulgado – nem pelo Ministério da Economia nem pelo Senai. O argumento é que os vouchers têm custo diferente entre si. Dependeria se os cursos técnicos são presenciais, semipresenciais ou a distância.
Para o diretor-geral do Senai, Rafael Lucchesi, o entendimento com o governo foi positivo e a construção do novo sistema de vouchers foi bem azeitada com a equipe econômica. Ele explicou que toda a rede de aproximadamente mil unidades operacionais – fixas e móveis – da entidade estará à disposição do programa.
De acordo com Lucchesi, pelo menos 70% dos desempregados que passam por cursos ou treinamentos do Sebrae enquanto estão fora do mercado formal de trabalho acabam se colocando ou recolocando no mercado de trabalho formal em até um ano.
“Temos papel decisivo para a competitividade da indústria brasileira e na empregabilidade dos trabalhadores”, diz. O Senai recebe mais de 2 milhões de matrículas por ano – houve um pico de 3,8 milhões de matrículas em 2014.
Matéria originalmente publicada no Valor Econômico.